__________________ O Início da Dramaturgia
Elza Rocha Pinto
Nelson
nasceu em 23 de agosto de l9l2, em Recife, e foi o quinto filho de uma família
numerosa. Sua mãe teve quatorze filhos. Seus outros oito irmãos nasceram no
Rio.[1]
Seu
pai, Mário Rodrigues, era um jornalista bastante combativo. Fez muitos inimigos
políticos em Recife. Em parte por isto, Maria Esther, mãe de Nelson, insistiu
que ele devia tentar a vida no Rio de Janeiro. Ele vem sozinho, e começa a
trabalhar no Correio da Manhã. Mas é demitido. Nesta ocasião Maria Esther chega
de Recife, trazendo todos os filhos. Quando Mário consegue seu emprego de
volta, eles passam a morar na Aldeia Campista. Muitos acontecimentos deste
período vão marcar a temática rodrigueana.[2]
Nelson não se achava bonito. Tinha problemas
com seu corpo e vergonha de sua cabeça. De fato seu físico não ajudava; possuía
um tronco desproporcional, e uma enorme cabeça, que chamava muita atenção.
Futuramente ele vai se descrever naquele tempo como “pequenino e cabeçudo como
um anão de Velásquez”.[3] É possível que Nelson se sentisse assim, deformado e monstruoso. Sendo mais precoce e mais inteligente do que
os outros, ele era um menino diferente
em relação aos garotos de sua idade. Aos sete anos ele mesmo pede que sua mãe o
inscreva na escola. Aos 8 anos
surpreende sua professora, com uma redação, sobre um episódio de adultério,
onde já revela todo seu talento de futuro escritor.
Sua redação não poderia deixar de ser
premiada, mas já censurada, não poderia ser lida na frente da classe. Nelson já
era um autor maldito, aos oito anos de idade! Sua professora foi mostrá-lo à
uma colega sua, e depois foram em comitiva à sala de uma terceira
professora. Nelson confessou futuramente
que ele adorou ser, pela primeira vez, o centro das atenções.
Esta
primeira redação aponta o caminho trilhado pela obsessão de Nelson: o entrelaçamento entre o sexo e a morte
Sem dúvida o clima de festa, após a devastação da Gripe Espanhola, era de erotismo. Além disto, os acontecimentos da
Rua Alegre iam aos poucos contribuindo para formar o imaginário do menino. [4]
Em que pese estas influências,
uma outra fonte, bem mais próxima de Nelson, contribuiu intensamente para a
famosa redação do marido traído: os ciúmes de seu pai, que eram intensos.
Nelson reverenciava o pai como a um herói; quanto a mãe, ela era a pessoa mais
amiga, meiga, e “linda como Nossa Senhora”.[5] Mas os desentendimentos do
casal, em função dos ciúmes de Mário, eram freqüentes. E Nelson presenciava
bate-bocas tremendos, que terminavam sempre com o pai de joelhos, agarrado em Maria
Esther, jurando que aquilo não se repetiria.
Era
ciumento como um marido de ópera. Não deixava a mulher sair sozinha e muito
menos de bonde: havia um gaiato em cada ponto, alerta para a menor centelha de
um tornozelo exposto, mesmo que de meias, na hora de subir ao estribo. Se Maria
Esther tinha de sair de casa, que fosse em carro fechado e com um dos filhos.[6]
Além
dessa influência de seu pai, Nelson teve uma outra fonte importante para suas
futuras estórias, em suas leituras, que nunca
foram censuradas pelos pais. Ele lia
tudo que lhe caía nas mãos: livros baratos, almanaques e uma grande
quantidade de subliteratura, que incluíam romances variados.[7] E muitos folhetins de
jornal. O folhetim era uma característica dos jornais na época. Cada jornal
tinha o seu romance publicado em capítulos, à semelhança das novelas da TV.
Através das leituras destes folhetins Nelson
foi entrando em contato com seu futuro estilo.
A
educação de Nelson foi muito liberal. Nunca apanhou dos pais. Uma única vez sua
mãe ficou zangada a ponto de querer lhe bater. Isto aconteceu quando ele foi expulso do Colégio Batista, aos quatorze anos, na metade do curso ginasial. [8]
Com
o passar do tempo, o prestígio de Mário Rodrigues aumentou. Com a melhoria salarial, a família
se mudou para uma nova casa, ainda na Tijuca. No entanto, boa parte do seu
salário desaparecia no Clube dos
Democráticos, sociedade carnavalesca da qual Mário era um torcedor ardente.
A boemia de um lado, e o fascínio pela política por outro, ocupavam o dia de Mário
Rodrigues. Sobrava pouco tempo para os filhos. A responsabilidade da educação
ficava, então, à critério de Maria Esther.[9] Para compensar sua
ausência em casa, Mário deixava os rapazes freqüentarem o Correio da Manhã. E assim o
jornalismo, aos poucos, entrou na vida de cada um deles.
Em
1924 seu pai é condenado por injúria e difamação contra o governo, ficando
preso por um ano. Maria Esther, que podia visitá-lo três vezes na semana, sempre
levava três ou quatro filhos. Ela ficava para passar a noite, enquanto o mais
velho voltava com os menores para casa.
Nelson, com doze anos, visitava seu pai na
prisão com freqüência. Nesta época, começando a entrar na adolescência, ele vai
viver uma “espécie de indolência melancólica”.[10]
Aos poucos abandona a praia, e os exercícios, desinteressando-se
inclusive pelas peladas. Os irmãos
tinham quase que suborná-lo para que ele participasse das brincadeiras.
Uma atmosfera de fog envolvia Nelson à medida que ele
entrava na adolescência. Estava ficando depressivo, como costumam ficar os
meninos nessa idade - só que, nele, essa depressão era dramática, de tango,
porque ele só faltava subir num caixote para proclamá-la. Vivia suspirando
pelos cantos e, às vezes, soltava uma exclamação que certamente lera nos
livros, mas que ninguém sabia se era a sério ou não: ‘Eu sou um triste!’- uma
frase que, aliás, continuaria repetindo pela vida afora. [11]
Sua mãe
achava que isto era o resultado de seus fracassos amorosos, na medida em que,
apaixonado, não era correspondido.[12]
Ao sair
da prisão Mário Rodrigues resolve fundar seu próprio jornal, por ter se
decepcionado com Edmundo Bittencourt. Assim surge A Manhã, jornal combativo, muito virulento, que sofreu doze
processos só nos dois primeiros anos.
Aos
treze anos e meio, em dezembro de l925, Nelson Rodrigues, consegue convencer
seu pai a deixá-lo trabalhar como repórter de polícia, passando a ganhar um
salário de trinta mil reis por mês.[13] A matéria policial era
feita nas delegacias, ou por telefone. Mas algumas vezes a caravana[14] do jornal saía até o
local, tentando chegar antes da concorrência, para publicar o furo, ou a notícia em primeira mão.[15] No início Nelson se encarregava da ronda das delegacias, por
telefone. Aos poucos foi impressionando as pessoas pela facilidade com que
impunha dramaticidade às notícias que os repórteres traziam das ruas. Seu maior
interesse e sua especialidade na época, aquilo que o fazia sair na caravana, eram os “pactos de morte entre
jovens namorados”. Típica história de folhetim, parecia uma epidemia na década
de 20. [16]
Em
parceria com seu primo, Augusto Rodrigues, Nelson funda um jornalzinho, Alma
Infantil. De estilo atrevido e agressivo, como o jornal de Mário, ele vai
indo bem, até comprar uma briga com seu pai, atacando seu ídolo, Rui Barbosa. É
despachado sumariamente de volta às crônicas policiais.
Com
quatorze anos Nelson começa a freqüentar o Mangue. Para os homens de sua geração, a única alternativa
de sexo fora do casamento era através das profissionais. Um tipo de
relacionamento, que ele considerava como “o seu purgatório particular do sexo
sem amor”, e que Nelson vai manter mesmo em sua vida adulta.
Por
pouco Nelson Rodrigues escapa da prisão, quando seu pai e seus três irmãos mais velhos[17] são detidos por suspeita
de um atentado contra um repórter de A
Democracia. Nelson estava em Recife, recuperando-se de uma de suas
profundas depressões. Aos dezessete anos, Nelson se apaixonava com freqüência. Porém nunca era correspondido, o que causava
intensos episódios de melancolia. Em Recife ele ficou durante um mês. Saiu da
depressão ao se apaixonar por uma prima
de quinze anos,[18]
e entrou numa espécie de “euforia
mórbida”, onde podia até deitar-se no
meio da rua, fingindo ter sido
atropelado.
Mário
Rodrigues ganha muito dinheiro com A
Manhã, e a família se muda para um luxuoso palacete, no então deserto Posto
Seis. Boêmio, continua chegando altas madrugadas, escrevendo, às vezes, o
artigo de fundo, no bar Brahma, na
companhia de Orestes Barbosa. Mas cheio de dívidas Mário acaba perdendo o jornal
para seu sócio.
Só que logo depois ele vai abrir
outro jornal: Crítica,[19] também de grande sucesso,
inclusive pela renovação da aparência gráfica. Seu novo jornal chega a
revolucionar a caricatura brasileira. O jornal era forte em vários setores: na
política, no esporte, e na página policial, dedicada aos crimes:
Diariamente
a caravana da “Crítica” descobria um caso aterrador do
submundo carioca e o explorava até o último pingo de sangue ou esperma: casais que se esquartejavam por ciúme, filhos
que torturavam pais entrevados, mães que seduziam filhos, irmãs que se matavam
pelo mesmo homem, padres estupradores e toda sorte de adultérios.
[20]
As
ilustrações de primeira qualidade, à cargo de Roberto Rodrigues, reconstituíam
“a cena do crime com um toque tão dramático, erótico e sensacionalista quanto o
texto. Era de um mau gosto violento e propositado.[21]
Roberto
era um dos filhos mais queridos, e apesar de não ser o mais velho, tinha muita
autoridade, segurança e determinação, liderando seus irmãos. Bem casado,
simpático, bonito e inteligente e sensível.
As mulheres se encantavam com seu ar triste e taciturno.
Sua especialidade eram os
desenhos; com dezessete anos entrara para
a Escola de Belas Artes, onde chamou atenção pelo seu traço moderno e
ousado. Tornou-se muito amigo de Cândido Portinari, a quem começou a ajudar. Intelectual de grande atividade no meio
cultural, Roberto praticamente lançou Portinari atacando, pela imprensa, os
jurados do Salão Oficial da Escola de
Belas Artes.[22] Expressava suas opiniões de maneira franca e
combativa. Em Crítica, Roberto
focalizava, com seus desenhos, os crimes e escândalos. A matéria da oitava
página virava quase um folhetim, pois Roberto ilustrava o principal crime do
dia. Mário Rodrigues não concordava com aquela linha editorial da seção
policial. Preferia que isto fosse feito no futuro jornal que pretendiam abrir:
a Última Hora. Achava que Crítica deveria se dedicar aos
editoriais políticos.
Em l929 Roberto é assassinado na
redação da Crítica, por causa de uma reportagem
sobre a separação de uma escritora. E isto muda inteiramente a rota da família
Rodrigues. No dia 29 de dezembro, Sylvia Thibau, profundamente perturbada pelo
teor escandaloso da reportagem sobre sua separação, compra um revólver numa
loja no centro, e vai até a redação de Crítica procurar Mário Rodrigues. Achou
Roberto, a quem matou com um tiro. Nelson estava lá, viu a moça chamar o irmão,
ouviu o tiro, tentou acudir Roberto. Mas já era tarde. Roberto morreu poucos
dias depois. Conforme diz Ruy Castro:
Ninguém
conseguirá penetrar no teatro de Nelson Rodrigues sem entender a tragédia
provocada pela morte de Roberto. No mesmo dia do enterro, toda a família pôs
luto. Os homens ainda podiam sair à rua de terno escuro ou com o fumo na
lapela, mas suas irmãs se cobriram de preto da cabeça aos pés. Milton, o irmão
mais velho, ia para o porão do palacete, antigo território de Roberto, apagava
as luzes e ficava horas no escuro - à
espera de um milagre que o fizesse vê-lo ou ouvi-lo. Nelson apenas chorava.
Joffre, de catorze anos, apanhou um revólver de Mário Rodrigues e passou a
andar armado pela cidade à noite. Sabia que Sylvia tivera sua prisão relaxada.
Se a encontrasse, a mataria. [23]
A partir daí Mário Rodrigues
nunca mais foi o mesmo. Emagreceu muito, envelheceu. Sentia-se profundamente
infeliz. Os cabelos ficaram grisalhos em poucos dias. Achava-se responsável
pela morte de Roberto, lembrando a todos que era ele quem deveria ter morrido
no lugar de Roberto. Maria Esther também não se consolava: “Perdôo tudo, menos
isto”. Este tudo se referia aos
“sumiços de Mário, suas carraspanas, os ataques de ciúmes, as brigas entre os
dois e as cartas e telefonemas anônimos de mulheres contra ela.” Dois meses
depois, Mário acabou morrendo.
Com a morte do pai, Crítica passa a ser dirigida por Milton e por Mário Filho, até que,
durante a Revolução de 1930, a redação do jornal é inteiramente destruída. Não
sobra nada; os Rodrigues ficam sem recursos, e sem meios de sobrevivência.
Começa assim um período muito difícil
para a família. Tudo que tentaram dava errado. Perderam até o leilão com os
despojos de Crítica. Restava
processar a União pelo empastelamento.
Porém por falta de dinheiro só conseguiram dar início à ação em 1931.
Passaram meses sem trabalho, porque todos os jornais tinham medo de empregar os
Rodrigues. Crítica tinha feito
oposição cerrada contra os vitoriosos da revolução de 1930. Os Rodrigues
viveram dez anos de dificuldades, sendo
que três, foram de grande fome. Houve épocas em que eles passaram a pão com manteiga; e na falta desta, usavam
azeite, ou mesmo banha de porco, no pão,
que constituía a única refeição do dia; e mesmo assim, nem todos os dias.
Estabeleceram um rodízio: dia sim, dia não todos tomavam uma xícara de café com
leite; só as meninas se alimentavam todos os dias. Aos poucos, foram vendendo
todos os pertences, desde móveis até os aparelhos domésticos. Leiloaram os
quadros. Quando o aluguel ficava atrasado mais de três meses, eles deixavam a
casa. A partir de 1931, os Rodrigues passaram por uma ciranda de
endereços, sempre para uma casa cada vez
menor, e mais pobre.[24] Mas sempre na Zona Sul, em Ipanema ou
Copacabana.
A
situação começou a melhorar com a ajuda de Roberto Marinho. Assumindo a direção
de O Globo, com a morte de seu pai,
resolve contratar Mário Filho, seu colega de sinuca, para a página dos
esportes. Mário pede a contratação de Nelson e Joffre. E, assim, eles começaram a conseguir dinheiro para o
sustento da casa. Só que ainda era pouco para a sobrevivência da imensa família.
Nelson
herdara os ternos, gravatas e chapéus de Roberto. Ele foi usando até que as
roupas se reduziram a um único terno, “com o qual ia trabalhar todos os dias -
porque não podia tirá-lo para lavar. Nelson andava só de sapatos, porque não
tinha meias, e usava a mesma camisa durante três ou quatro dias”.[25] A falta de dinheiro
muitas vezes obrigava Nelson a ir a pé para a redação de O Globo, no centro. E então começaram a surgir as conseqüências,
pois o longo período da fome, e as precárias condições de vida, acabaram por
debilitar sua saúde. Em 1934, Nelson estava com tuberculose.[26] Internou-se em Campos de Jordão, no Sanatorinho,
onde teve sua primeira experiência com a dramaturgia, pois alguém sugeriu um teatrinho, e Nelson foi eleito escritor da peça; seu sketch foi um total sucesso. Após três
meses Nelson voltou ao Rio. Mas vai ter cinco recaídas da tuberculose nos anos seguintes, precisando
voltar ao Sanatorinho por três vezes
ainda, antes da descoberta da
estreptomicina em 1949. Alguns anos mais tarde, a tensão emocional e os
anos de desnutrição, sustentados pelas constantes dietas que Nelson era
obrigado a fazer, acabaram por provocar um outro problema: uma úlcera gástrica,
que acompanhou Nelson até o fim de sua vida.
Enquanto
isto, Mário Filho vai crescendo no mundo esportivo, renovando as reportagens esportivas, e inventando
eventos, como o concurso das escolas de samba. Organiza os campeonatos
modernos, dinamiza as torcidas, transforma o
Fla-Flu no grande acontecimento dos domingos. Acaba recebendo uma proposta
para se tornar sócio do Jornal dos Sports.
Daqui em diante a vida financeira dos Rodrigues melhora definitivamente.
A estas
alturas Joffre, o irmão ao qual Nelson era mais apegado, contrai tuberculose e
morre. Nelson se sentiu muito responsável pela transmissão da doença, e
acompanha toda a fase final de Joffre, em Correias. Com a morte de Joffre,
Nelson passa a se torturar com sentimentos de culpa. Entra em depressão,
ficando quase quinze dias sem comer. Acabou ele próprio tendo uma recaída da
tuberculose, e vai precisar se internar por mais três meses no Sanatorinho.[27] Ao voltar, assume a
coluna de arte lírica, responsabilizando-se pelas críticas das óperas, o que
foi lhe dando uma grande experiência em termos de carpintaria teatral.
Aos
vinte e cinco anos Nelson se casa com Elsa, a quem conhecera na redação de O Globo. E seu casamento em nada ficou
devendo aos enredos de seus folhetins. Para vencer a oposição da mãe dela, que
era contra o casamento, Nelson precisou se batizar, estudar o catecismo, fazer
a primeira comunhão, e casar-se escondido no civil. Logo após o casamento,
Nelson pediu para Elsa largar O Globo
Juvenil, de forma a encontrá-la sempre em casa, “de banho tomado, vestida e
cheirosa” à espera dele.
Com
seis meses de casamento, Nelson ficou temporariamente cego. A tuberculose
deixara como seqüela uma infeção, numa época em que não havia ainda
antibióticos. Tratado com anti-inflamatório, sua visão voltou, porém com uma
perda de trinta por cento nos dois olhos. E Nelson se recusava a usar óculos.
Mesmo quando ia ao Maracanã, quando então ele só via vultos correndo atrás da
bola. Adivinhava o que estava se passando no campo pelos sons que ouvia a
torcida fazendo. Ou então precisava que
alguém irradiasse o jogo para ele. Para se compreender o que este evento
deve ter significado para Nelson, é preciso lembrar a sua emocionada crônica
sobre sua filha Daniela.[28]
Quando
Elsa engravidou, em meados de 1941, impressionado com o sucesso das chanchadas, e precisando ganhar mais dinheiro, Nelson inicia sua trajetória no teatro.
Tentando
seguir a tendência da época, Nelson começa a escrever sua primeira peça, A Mulher sem Pecado. Tinha a intenção de
fazer uma peça engraçada. Mas logo a peça ganhou um tom dramático, e se
transformou num tenebroso drama.[29] A peça foi montada com o elenco da Comédia Brasileira, no Teatro
Carlos Gomes. Ficou duas semanas em cartaz. Alguns críticos não gostaram,
entre eles, o de seu próprio jornal. Roberto Marinho, que tinha gostado da
peça, acabou por despedi-lo, ao ouvir o elogio que Manual Bandeira fez a
Nelson: “Esse rapaz, o Nelson, tem um grande talento. A peça é formidável!”. [30]
Independente da crítica, a estréia da peça entusiasmou Nelson, que naquela mesma noite, ao voltar para casa,
começa a escrever Vestido de Noiva, peça
que foi concluída em uma semana. Nelson sempre procurou esconder este fato,
porque achava que isto iria diminuir a
opinião das pessoas sobre a qualidade da peça. A ousadia do texto assustava
Elsa, que datilografava a peça, pois algumas vezes ela ligava para a redação
reclamando: “Nelson, você deve ter errado. A peça não faz sentido. Não estou
entendendo nada”. Uma das vinte cópias batidas foi entregue a Manuel Bandeira,
que sobre ela escreve:
Nelson
é um poeta. Talvez não faça nem possa fazer versos. Eu sei fazê-los. O que me
dana é não ter como ele esse dom divino de dar vida às criaturas da minha
imaginação. [31]
Bandeira
estava se referindo ao fato do público estar acostumado com as facilidades das
chanchadas. Vestido de Noiva tinha
uma construção complexa: a ação se passa em três planos: realidade, memória e
alucinação da heroína. Alaíde que foi
atropelada no largo da Glória está sendo operada. A peça relata a realidade:
seu atropelamento, as notícias anunciadas pelos jornaleiros, a operação da
moça. Mas relata também duas dimensões relacionadas com a própria Alaíde: suas memórias de um passado
real, e as alucinações retiradas de sua imaginação delirante. Os flash-backs e as mudanças de planos eram
freqüentes. Os personagens passavam de uma dimensão para a outra em segundos. A
montagem era evidentemente muito difícil, para uma época em que os atores nem
decoravam seu texto. Os profissionais de
teatro desencorajavam Nelson, dizendo que era a peça impossível para o palco
Nelson distribuía cópias pelo Rio de Janeiro, pedindo aprovações por escrito, arrancando
bilhetes elogiosos dos amigos. Depois
mostrava para os possíveis produtores. Mas mesmo alguns amigos achavam a
peça complicada. Um deles, seu amigo Henrique Pongetti dizia:
A
peça é um caos. Ninguém vai saber quem é quem. Nem os intérpretes vão se
identificar com os personagens. [32]
Finalmente
o grupo Os Comediantes resolveu
montar sua peça. Com a estréia de Vestido
de Noiva em 28 de dezembro de l943, o talento de Nelson foi reconhecido.
Até Carlos Lacerda, que futuramente vai atacá-lo tanto, chegou a dizer numa
conferência no Teatro Phoenix, que
“Nelson Rodrigues estava revolucionando a linguagem do teatro mundial”.[33] Entre outras coisas a
imprensa dizia que “a Semana de Arte
Moderna de l922, chegara enfim ao palco e que Nelson estava para o teatro
como Carlos Drummond para a poesia, Villa-Lobos para a música, Portinari para a
pintura e Oscar Niemeyer para a arquitetura”. [34]
Logo
depois da estréia, em fevereiro de 1944, Freddy Chateaubriand oferece a Nelson
um salário irrecusável, e ele se transfere para os Diários Associados.[35] Pouco tempo depois começa
a escrever um folhetim para O Jornal.
Assina com o pseudônimo de Susana Flag,
porque não queria ser conhecido como o autor de uma literatura menor. Mas o
estilo era inconfundível. A começar pelo título: Meu Destino é Pecar.[36] O folhetim levantou a
tiragem de O Jornal, que passou de
três mil exemplares para doze mil, em apenas quatro meses. Lançado em livro,
vendeu mais de trezentos mil exemplares.
Chegou até a virar novela de rádio, nas emissoras Associadas.
Os Chateaubriand insistem com Nelson para que
ele continue a escrever folhetins. Assim Susana
Flag volta às páginas com Escravas do
amor, outro sucesso arrasador, e que se transformou em livro, repetindo a
carreira do primeiro. Na verdade, Susana
Flag quase toma o lugar de Nelson Rodrigues, tornando-se um nome
nacionalmente conhecido.
Em 1945,
sobrava pouco salário para Nelson, uma vez que ele continuava a ajudar a mãe, que a estas alturas morava já
num endereço fixo, na rua General Glicério, em Laranjeiras. Nenhuma das irmãs
Rodrigues havia ainda se casado. Em parte por interferência dos irmãos. As
mudanças liberais do pós-guerra não chegavam ao interior da família Rodrigues.
Por exemplo, nem a mãe nem irmãos gostavam que as moças fossem à praia; o uso
das duas peças era terminantemente proibido. Homem, dentro de casa, somente o
professor de inglês, mesmo assim, de forma muito controlada, e por pouco tempo.
Mesmo dentro de casa, as moças usavam vestidos com mangas compridas, cujo
comprimento ia até a canela, sendo indispensável as meias e a combinação. Sair
à noite, só com um dos irmãos. Até Stella, médica, e com trinta e cinco anos,
só podia trabalhar até as seis horas da tarde. E mais: “Nas festinhas
domésticas, quase sempre apenas em família, se um dos irmãos quisesse tirar uma
irmã para dançar, tinha de pedir
permissão a dona Maria Esther. Os Rodrigues não se beijavam uns aos outros e
nem se faziam afagos físicos, mesmo um inocente cafuné”. [37]
No fim de l945 a reputação de
Nelson como teatrólogo estava consolidada. Suas duas peças voltaram a ser
encenadas no Teatro Phoenix,[38] com Os Comediantes, o mesmo grupo que tinham atuado na estréia de Vestido de Noiva. Cada peça ficou dois
meses em cartaz, com lotação esgotada.
Nelson tinha feito algumas modificações em A Mulher sem Pecado, introduzindo um monólogo para Lídia, no
terceiro ato:
...o que fez com
que Stella Perry fosse aplaudida em cena aberta todas as noites. Não era um
papel comum de mulher bonita, mas o de uma mulher que não tinha culpa de ser
bonita, honestíssima - e casada com um demente. (...) Na versão original, o
paralítico colérico era um dono de jornal, com todos os traços de Mário
Rodrigues. Para a nova encenação, Nelson transformou-o num industrial e foi
assim que ele ficou, porque aquela se tornou a versão definitiva da peça. [39]
Para garantir que o público
entendesse suas peças Nelson continuava a escrever sobre ele próprio, usando
pseudônimos. Como Grock, por exemplo,
iria escrever:
Os personagens,
movendo-se na sombra e na luz, parecem possessos. E não sabemos se possuídos de
Deus ou do demônio. Nelson Rodrigues faz psicologia em profundidade, faz o que
poderíamos chamar de psicologia abissal. [40]
No
entanto, ele não precisava se preocupar, porque tinha conseguido consolidar sua
reputação como autor dramático. Isto até escrever Álbum
de Família. Com data de estréia marcada para 17 de fevereiro, a peça foi
interditada pela Censura em janeiro
A
proibição da peça foi vista como um perigoso precedente de censura à imprensa e
ao livre pensamento. Mas os intelectuais se dividiram. Alguns combateram a
interdição da peça, outros a defenderam, achando que Álbum de Família tinha passado dos limites, e que a sua liberação
seria uma ofensa contra a família brasileira. Achavam que se a peça fosse
liberada poderia realmente vir a incentivar o incesto. Nelson sustentou quatro
meses de luta pela liberação, repetindo pelos cafés e redações do Rio de
Janeiro a sua perplexidade:
Mas como podem censurar? Álbum de Família é uma peça bíblica.
Então teriam que censurar também a Bíblia, que está varada de incestos! [41]
Quando sentiu que o veto seria
mantido Nelson publicou a peça em livro. Surgiram críticas à peça, como teatro
de má qualidade.[42]
Tentando inutilmente liberar sua peça, Nelson acabou sendo o pivot de um debate onde jornalistas e
escritores declinavam sua adesão ou sua discordância ao veto da censura. Este debate será apresentado
mais adiante.
Para se
refazer da interdição de Álbum de Família,
Nelson escreve O Anjo Negro e Senhora dos Afogados. Todas duas também
censuradas. Desta vez nem todos os seus amigos o apoiam na luta contra a
censura. Em parte em função do tema de uma das peças: o racismo contra o negro
no Brasil. E pelo fato de Nelson querer dar o papel principal para Abdias do
Nascimento. No Brasil os papéis de negros ainda eram representados por brancos
que pintavam o rosto de negro, ao estilo de Al Johnson. Mas Nelson conseguiu
liberar a peça.[43]
Novamente um sucesso de dois meses. Quanto a Senhora dos Afogados, Nelson tentou uma
estratégia achando que daria certo.
Sugeriu ao ministro da Justiça que a censura fosse feita por uma comissão de
intelectuais. O ministro, com boa vontade, deixou a escolha a critério de Nelson.
Ele poderia ter facilmente indicado alguns de seus amigos ou admiradores, como
Manuel Bandeira. Porém, preferiu ser imparcial , indicando os nomes de Alceu
Amoroso Lima, Olegário Mariano e Gilberto Freyre, moralmente insuspeitos.
Nelson tinha certeza da liberação, com dois votos a seu favor e um contra (o de
Alceu Amoroso Lima). Mas para sua
surpresa, Olegário Mariano, que o conhecia desde sua infância, e tinha
sido amigo de seu pai,[44] acabou votando contra.
Aos
poucos a admiração inicial que Nelson causara, iria diminuindo. Augusto
Frederico Schmidt tinha lhe perguntado o motivo da insistência na torpeza.
Manuel Bandeira reagira mais friamente à leitura de Senhora dos Afogados, e acabara por lhe perguntar: - “Por que você
não escreve sobre pessoas normais?”. Nelson não teve coragem de responder que
suas peças tratavam de pessoas tão normais, como ele próprio, como Bandeira, e
como todo mundo. Bandeira poderia se ofender, e achar que estava sendo chamado
de anormal. Para tentar responder a
estes amigos Nelson escreve o que muitos consideram sua obra prima: Dorotéia.
Mas o
estigma do autor maldito estava formado. Isto se reflete em seu famoso
depoimento à revista “Dyonisos”, em 1949:
Com Vestido de
Noiva, conheci o sucesso; com as peças seguintes, perdi-o
e para sempre.
Não há nessa observação nenhum
amargor, nenhuma dramaticidade.
Há simplesmente, o reconhecimento de um fato e sua aceitação. Pois, a partir de
Álbum de Família - drama que se
seguiu a Vestido de Noiva -enveredei
por um caminho que pode me levar a qualquer destino, menos ao êxito. Que
caminho será esse? Respondo: de um teatro que se poderia chamar assim -
desagradável. Numa palavra, estou fazendo um ‘teatro desagradável’, ‘peças
desagradáveis’. No gênero destas, incluo desde logo Álbum de Família, Anjo Negro
e a recente Senhora dos Afogados. E
por que ‘desagradáveis’? Segundo já disse, porque são obras pestilentas,
fétidas, capazes , por si sós, de produzir o tifo e a malária na platéia. [45]
[1] Pela ordem, Miltlson, Roberto(?),
Mário Filho, Stella, Nelson, Joffre,
Maria Clara, Augustinho, Irene, Paulinho, Helena, Elsinha, Dulcinha.
[2] Ruy Castro, O Anjo Pornográfico: a vida
de Nelson Rodrigues, pp. 2l-22. Pequenos incidentes da vida diária iriam
organizando o mundo fantasmático de Nelson. Desde acontecimentos cotidianos até
situações dramáticas. Incidentes simples como sua primeira ida ao cinema, em
1916, vai lhe dar margem para registrar uma época: “Quando apagou a luz, nasceu
na treva uma misteriosa e tristíssima fauna de tosses”; no final do filme,
uma descoberta: “Olhei e vi: - lá estava ela, num canto da sala de espera. Era uma escarradeira
e flor: - subia por um caule fino para se abrir em lírio (...) Linda, linda,
imitando um lírio ou um copo-de-leite”(pag. 18).
Nelson ainda viveu vestígios da Belle Époque: parto em casa, velório em
casa, escarradeira na sala, bronquites. Além deste quotidiano, outros
acontecimentos mais graves e trágicos marcaram Nelson. Os personagens com querm
conviveu acabam formando seu lastro poético. A morte de um vizinho, registradao em sua memória lhe dá o mote para uma das várias crônicas através das
quais Nelson chora e faz o luto pela morte de Guimarães Rosa:
-: A grande dor não se assoa. SuaA
vizinhança era pródiga em tragédias, como o suicídio a que Nelson presenciou e viveu: o suicídio da
menina que foi seu primeiro amor, e que morreu queimada. Nelson
presenciou a cena: “... a
própria menina irrompia, em fogo. Ensopara o vestido em querosene, riscara um
fósforo e agora ardia como uma estrela”. Nelson
Rodrigues, O Óbvio Ululante, p.
41. (pag. 41)
[3] Ver
a crônica “Pirâmides e biscoito”,
emem Nelson Rodrigues, O Óbvio Ululante, p.
de Nelson
Rodrigues, pag. 18.
[4] Talvez como influência de
dois grandes acontecimentos vividos por Nelson: a Gripe Espanhola, que matou 15 mil pessoas no Rio de Janeiro, e o Carnaval
da Ressureição, em 1919. “O tema
da morte se mistura com a luxúria do sexo, porque para responder à epidemia da
‘Espanhola’ o Rio de Janeiro produz o ‘carnaval da ressureição’ . , Ruy Castro, O Anjo Pornográfico - a vida de Nelson
Rodrigues, p.
26.p. 26
[5] Depoimento de Nelson Rodrigues, em Entrevista para o Ciclo do Teatro Brasileiro
do Museu da Imagem e do Som, em 30/06/67.
[6] Op.
cit., p. Pag. 28.
[7] Como “Rocambole ”de Ponson
du Terrail; “Os
amantes de Veneza ”de
Michel Zevaco, “O conde de Monte-Cristo ”de Alexandre
Dumas; os fascículos de “Elzira, a morta-virgem”, de Hugo
de América.
[8] Nelson foi expulso por
rebeldia: questionava os professores, insistindo que eles justificassem aquilo
que estavam dizendo. Começou a tirar notas baixas e zeros, o que só fazia
acentuar sua veia mordaz e sarcástica.
[9] Mas,
E, com tantos filhos,
ela não podia dar conta de tudo. Aos
onze anos Nelson já fumava bastante, no caminho do pai que “acendia cigarros e charutos uns nos outros”.
Ruy Castro, O Anjo
Pornográfico - a vida de Nelson Rodrigues,
p. 26.
[10] Op.
cit., p. Idem, p. 40
[11] Op.
cit., p. Idem, p. 40
[12] Em sua angústia, Nelson
isolava-se em seu quarto ou na Quinta da Boa Vista, com os livros que podia: Os miseráveis e O homem que ri de Victor
Hugo, Naná e Germinal de Émile Zola; Contos de Hoffman; Amor de perdição de Camilo
Castelo Branco e muito Machado de
Assis, e Eça de Queiroz.
[13] Nelson passa a conviver com
repórteres e escritores importantes. “A Manhã”
teve alguns colaboradores ilustres: Monteiro
Lobato, Antônio Torres, Agripino Grieco, Medeiros e Albuquerque, Ronald
de Carvalho, Maurício de Lacerda,
Zeca Patrocínio. Entre os fixos: Danton Jobim, Orestes Barbosa e Renato
Viana. Joracy Camargo, Odilon Azevedo e Henrique Pongetti, todos ainda muito eram jovens ainda. Sem
esquecer Apparicio Torelly, - o futuro
Barão de Itararé, título que ele
próprio se atribuiu, -
com sua coluna diária “Amanhã tem mais”,
de muito sucesso entre os leitores.
[14] Nome que se dava à dupla de
repórter e fotógrafo.
[15] Ruy
Castro lembra o seguinte: “Numa
cidade lindamente sem assaltos como o Rio, em que a captura de um ladrão de
galinhas era uma sensação, quase todos os crimes envolviam paixão ou vingança.
Maridos matavam mulheres por uma simples suspeita, sogras envenenavam genros,
porque estes não lhes tinham dado bom dia aquela manhã e casais de namorados
faziam pactos de morte como se estivessem marcando um encontro no ‘Ponto Chic’
”. Ruy Castro, O Anjo Pornográfico - a vida de
Nelson Rodrigues.
[16] Sobre isto diz Ruy Castro: “...Os namorados se matavam tomano veneno com
açucar, sendo o veneno quase sempre formicida, permanganato de potássio ou um
desinfetante chamado ‘Lysol’. O açucar emprestava à beberagem um sabor
terrivelmente simbólico, assim como os locais que eles escolhiam para morrer: a
Cascatinha, o Silvrestre ou Paquetá - todos cenários de cartão-postal.”“...Os namorados se matavam tomando veneno com açúcar,
sendo o veneno quase sempre formicida, permanganato de potássio ou um
desinfetante chamado ‘Lysol’. O açúcar
emprestava à beberagem um sabor terrivelmente simbólico, assim como os locais
que eles escolhiam para morrer: a Cascatinha, o Silvestre ou Paquetá - todos
cenários de cartão-postal.”.
Op.
cit., p. 48
[17] Milton, Roberto e Mário Filho.
[18] É interessante notar como
esta paixão de adolescência acaba marcando, como uma herança, o personagem de Jonas, interessado apenas por meninas de
15 ou 16 anos de idade.
[19] O jornal tinha um estilo
malcriado e bastante agressivo. Por exemplo, em março de 1929, publicava na
primeira página uma foto do conde Francisco
Matarazzo que ocupava quatro colunas, com a palavra “Ladrão” estampada em
sua testa, acusando-o de irregularidades nos negócios com o café. Artur Bernardes, ex-presidente, era
chamado de “Caim”, “excelso canibal”, “hiena insaciável”, “urubu
sanguinolento”, etc. Op. cit., p. (Pag.
68.
?)
[20] Op.
cit., p. Idem, p. 69.
[21] Op.
cit., p. Pag. 70.
[22] Num artigo de 1929, em Critica, Roberto Rodrigues chamou o Salão
de “arapuca”, afirmando que “ser membro
do júri da exposição oficial é uma profissão leve, como a do gigolô”.
Segundo ele “os jurados eram mestres em
trocar favores, aceitar suborno das lojas de material de pintura e exercer uma
política mesquinha para conceder o cobiçado prêmio de viagem” a Paris. Op.
cit., p. 76.
[23] Op. cit., p. 96-97.
[24] Op. cit., p. 110.
[25] Op. cit., p. 116.
[26] Por não ter um diagnóstico
correto no início, Nelson foi submetido ao tratamento habitual para febres não
identificadas: arrancaram todos seus dentes, quase perfeitos. E ele, aos 21 anos de idade, foi obrigado a usar
dentaduras.
[27] No que diz respeito a seu
patrão, Roberto Marinho, Nelson
sempre fez uma observação de gratidão: em todas as suas internações ele nunca
deixou de pagar integralmente seus salários. Já Samuel Wainer, apesar de ser da esquerda, não agiu da mesma forma.
Quando Nelson, por motivos de saúde, precisou se afastar de sua coluna, na Ultima Hora, não somente teve seu
salário suspenso, como ainda teve o desgosto de ver crônicas antigas serem
publicadas, durante todo o período de sua doença, como se nada estivesse
acontecendo.
[28] Ver Anexo III, para a reprodução de A Menina sem Estrela.
[29] É o próprio Nelson quem informa este fato. “E aí comecei a escrever e exatamente no
meio da primeira página, o negócio virou uma peça tenebrosa. E foi assim até o
fim. A peça que se impôs, a peça que tem a sua autonomia própria, a sua
autodeterminação. Seu clima, tudo estava lá muito bem disposto”. Nelson Rodrigues, Depoimento V, p. 123.
[30] Ruy Castro, O Anjo
Pornográfico - a vida de Nelson Rodrigues, p. Pag. 155.
[32] Op.
cit., p. 161.
[33] Op.
cit., p. Pa. 176
[34] Op.
cit., p. Idem, pp. 176
[35] Nelson
passou a ganhar um salário invejável,
saindo de 700 mil reis para cinco contos de réisEm fevereiro del944, Freddy Chateaubriand, levou Nelson para
os Diários Associados. Dos 700 mil reis
que Roberto Marinho lhe pagava, Nelson passou a ganhar um salário invejável de
cinco contos de réis. Por isto Nelson abandonou “O
Globo” na rua Beethancourt da Silva, onde ficara durante treze
anos, e foi para a Rua do Livramento, sede das revistas “O Guri”,
“Detetive”,
“A Cigarra e ”e “O Criuzeiro”. Nelson seria o diretor de redação de “Detetive ”e de “O g\Guri”.
“O
Cruzeiro ”era uma revista de muito prestígio. Suas
estrelas eram a
dupla de reportagem David Nnasser-Jean
Manzon, Franklin de Oliveira com
a seção “Sete
dias”, “O
Pif-paf ”de Vão
Gôgo ou Millor Fernandes, a
crônica de Rachel de Queiroz, e “O
amigo da onça ”de
Péricles. Sucesso total no país
inteiro. Qualquer pessoa citada em O
Cruzeiro virava nome nacional, e Nelson
vivia sendo citado, através de artigos que
ele próprio escrevia e que outros assinavam por ele.
[36] Interessante é que o
folhetim se inicia com uma questão que vai ser exatamente a solução da saga de Senhorinha em Álbum de Família: É possível uma mulher matar seu marido?,
pergunta-se Nelson. A história começava com um plágio
de Rebeca, a mulher inesquecível, de Daphne du Maurier. Ocorre um casamento
entre uma jovem e um viúvo dominador, que
não consegue esquecer a sua primeira mulher, que era linda e inteligente. Deste
ponto em diante surgia o dedo casamento
entre uma jovem feia e ingênua e um viúvo dominador que não conseguia esquecer
a primeira mulher - linda, inteligente, fabulosa -, todos morando numa fazenda
isolada. Até aí era um plágio de “Rebeca, a mulher inesquecível”, de Daphne de
maurier, que Nelson vira no filme de Hitchcock com Joan Fontaine e Laurecen
Olivier (...) Mas, dali para frente, sentia-se o dedo rodrigueano:
a primeira mulher morrera estraçalhada por cachorros em situação misteriosa. O
viúvo, aleijado de uma perna, tinha um irmão irresistível que passara a dar em
cima da nova cunhada. Ao mesmo tempo este irmão tinha
uma amante escondida, na floresta perto da
fazenda. “Esse irmão tinha uma amante escondida na floresta e, dentro
da casa da fazenda, havia uma prima a fim do viúvo. Os dois irmãos
tinham uma mãe dominadora e as subtramas ficavam por conta de um pelotão de
irmãs solteironas e virgens”. Op. cit., p. (pag. 185.)
[37] Op.
cit., p. Idem p. 192
[38] O Tteatro
Phoenix não existe mais. Ficava na esquina de Almirante Barroso e Rio
Branco. Foi derrubado para construírem o edifício Marquês de Herval.
[39] Esta descrição feita por Ruy Castro se encaixa como uma luva no
casal de Álbum de Família. Op. cit., p. 195P.
[40] Ruy Castro, O Anjo Pornográfico - a vida de Nelson
Rodrigues,
p.193/194. Este trecho da reportagem que ele escreveu sob o nome
de Grock mostra o quanto ele conhecia
Freud. Apesar disto, ele muitas
vezes insistiu no fato de nunca ter lido nada sobre psicanálise. Seus críticos,
sim, talvez não tivessem lido; parecem ter tomado a expressão “psicologia
abissal” como se fosse de Nelson
Rodrigues, e ela foi utilizada em mais de uma artigo da crítica teatral. (Pag. 193/194)
[41] Op. cit., p. 197
[42] Opinião, por exemplo de Álvaro Lins, que deu início a uma
prolongada polêmica através dos jornais..
[43] Paradoxalmente esta peça foi
liberada, mantendo-se a interdição contra Álbum
de Família. Affonso Machado, um
crítico e futuro ator, na estréia da peça listava os crimes cometidos pelos
personagens de Anjo Negro: “homicídios com agravantes, indução à
lascívia, três infanticídios, adultério, corrupção de menor, lesões corporais
graves, estupro e cárcere privado”, e especulava se Nelson estava querendo
concentrar em três atos “todos os
delitos previstos no Código Penal”.
Outras críticas falavam dos incestos, suicídios, violações de virgens.
Acusavam a peça de descer até o “último
degrau dos instintos” . Op. Cit., p.
202.
[44] Olegário Mariano abrigou toda a família Rodrigues, quando Elsa chegou de Recife trazendo todos os filhos, e
encontrou Mário Rodrigues desempregado.
[45] Pag. 213.Nelson
Rodrigues, Teatro Desagradável, em
Dionysos, Ano I, no. 1, p.17