__________________________Perversão em Álbum de Família
Elza Rocha Pinto
Nossa
intenção neste texto não é, em hipótese alguma, realizar um estudo sistemático
sobre o conceito de perversão. Muito menos confrontar posições, pois estaríamos
nos desviando de nossa questão principal. O foco de nosso interesse se centra sobre
a leitura de Álbum de Família. Como
esta peça está crivada de fenômenos perversos, achamos melhor introduzir o
conceito para melhor entendimento dos futuros textos. Não pretendemos,
portanto, discutir o termo perversão. No entanto, entendemos que seria
necessário fazer pelo menos uma apresentação esquemática de alguns conceitos
chaves da linguagem psicanalítica sobre as perversões. Ou seja, vamos tentar colocar os pontos
principais sobre a teoria das perversões. Não pretendemos nos estender aos
aspectos relacionado às suas diferenças. O fetichismo, o travestismo, o
voyeurismo e o sado-masoquismo só serão tratados dentro desta perspectiva
geral. Consideramos tais diferenciações fundamentais para a teoria
psicanalítica, porém elas ultrapassariam amplamente nossa atual questão. Por
isto, aqui, só vamos reter aquilo que se relacionar de um modo mais direto com
o tema que nos ocupa. Em textos anteriores, já indicamos como as peças de
Nelson produzem personagens densos, e ricos em emoções, de forma a permitir
exemplificar todo o vasto terreno destes desvios.
Na
análise que pretendemos fazer e publicar posteriormente, como recurso de
interpretação, vamos lançar mão de algumas categorias psicanalíticas que
poderão refletir melhor o caráter e o perfil psicológico dos personagens de Álbum de Família. Para tanto se faz necessário o exame de alguns dos conceitos
freudianos sobre a) desenvolvimento da libido, b) sobre a perversão e c) sobre
algumas de suas variações, como o sadismo e o masoquismo. O foco das
perversões, e especificamente, do sadismo, fornece um excelente terreno sobre o
qual fundamentar nossa análise da peça, uma vez que a crueldade é um dos temas
favoritos de Nelson Rodrigues, sendo bastante recorrente entre seus
personagens. Para confirmar esta suposição, ao examinar a peça Álbum de Família, devemos tornar claro o significado de alguns termos.
Álbum de Família é um berço de perversões. Esbarramos com elas
praticamente a cada página. Porém achamos que a exposição que se segue será
mais do que suficiente para enquadrar os personagens. A relação entre Jonas e Senhorinha, personagens
principais da peça, é nitidamente recortada no terreno das perversões,
tingindo-se com um colorido sado-masoquista.
A
priorização destas características, no entanto, não ignora o fato de que Álbum
de Família caiu no “excesso”, tanto ao gosto de Nelson Rodrigues. E isto
vai nos permitir encontrar também personagens com características fetichistas,
voyeuristas, exibicionistas.
Para a análise
que pretendemos realizar, importa, pois, a exposição da teoria geral sobre as
perversões. Para isto vamos partir das considerações traçadas por Freud em seus Três Ensaios
sobre a Teoria da Sexualidade. Freud vai se referir às perversões em outros
ensaios,[1]
mas este livro pode ser considerado como o epicentro de sua teoria sobre a
sexualidade. Tomando todo cuidado para não nos prolongarmos muito neste assunto,
gostaríamos de lançar mão de outras contribuições.[2]
À título de mera curiosidade, achamos que caberia também desdobrar a questão da etimologia da palavra
perversão, assim como apresentar uma breve história de como a perversão
terminou por se estabelecer dentro dos domínios da medicina.
[1]
Em 1919 Freud desenvolve pontos de
vista sobre o masoquismo, em Uma criança
é espancada; e volta a examinar esta temática em O problema econômico do masoquismo, em 1924. O homossexualismo é
examinado em 1920, A psicogênese de um caso de homossexualidade
numa mulher, e em 1922 com Alguns mecanismos neuróticos no ciúme,
paranóida e homossexualidade. O
Fetichismo é de 1927.
[2]
Como a contribuição de O. Fenichel
(s/d ), J. Chazaud (1973) e P. Valas (1990), entre outros. Além
disto, gostaríamos de deixar aqui algumas indicações para futuras consultas. Na
fase em que realizamos uma revisão
bibliográfica sobre a leitura psicanalítica de romances, poemas e peças,
encontramos alguns títulos que se referiam especificamente à questão das
perversões. Como por exemplo, The
Sadomasochistic Homotext: Readings in Sade, Balzac, and Proust por Saylor, Douglas B, publicado em 1992,
ou como o artigo de Lee Edelman, Plasticity,
paternity, perversity: Freud’s Falcon, Huston’s Freud, publicado em American
Imago, em 1994. Estas e outras referências poderão ser
encontradas relacionadas no texto Psicanálise e Arte - Levantamento Bibliográfico, neste blog.
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