sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Teoria das Perversões - A Independência da Pulsão



______________________Perversão - A Indepedência da Pulsão

Elza Rocha Pinto


É interessante observar que apesar de conseguir revolucionar a moral sexual do século XX, Freud não pôde, entretanto, se descartar inteiramente do moralismo da psiquiatria da época.  E acaba permanecendo preso a alguns preconceitos.  Como afirmam Laplanche-Pontalis (l970):
É difícil conceber a noção de perversão sem ser em referência a uma norma. [1]
Assim Freud (l905) acaba realmente por definir a relação sexual normal ao nível da genitalidade, mantendo a hegemonia da preservação da espécie. O fim sexual normal é definido em termos da Natureza.  Mas, independente disto, o importante é que em paralelo Freud (l905) inicia o resgate das perversões:
Porém ainda o ato sexual mais normal integra visivelmente aqueles elementos cujo desenvolvimento conduz às aberrações que descrevemos como perversões.[2]
Portanto, para Freud (l905) as perversões começam a fazer parte da vida sexual normal. Eis como ele aborda este fenômeno:
Determinadas relações intermediárias com o objeto sexual são admitidas como fins sexuais preliminares. Estas práticas preliminares, como a contemplação ou o toque do objeto sexual, podem se esgotar em si mesmas, ligando-se a sensações de prazer. Ou podem, por outro lado, contribuir para elevar a excitação até a realização fim sexual genital.
O prazer preliminar é o mesmo que já provocaram, embora em menor escala, as pulsões sexuais infantis (...) Muitas perversões não são, com efeito, senão tal detenção nos atos preparatórios do processo sexual.  [3]
E, esclarecendo melhor sua posição, ele acaba propondo um sistema de classificação:
As perversões são alternativamente: a) transgressões anatômicas dos domínios corporais destinados à união sexual; ou b) detenções naquelas relações intermediárias com o objeto sexual que normalmente devem ser rapidamente recorridas no caminho para o fim sexual definitivo. [4]
Entre estas relações intermediárias com o objeto sexual podem ser apontados os fenômenos do fetichismo, do voyeurismo, do exibicionismo, e do sadismo e do masoquismo. Em grande parte das perversões não vai ocorrer a integração destes impulsos pré-genitais numa sexualidade madura, onde a energia excedente se expresse através do amor e da procriação, transcendendo os limites da auto-sobrevivência do indivíduo. Como resume Alexander (1965):
As perversões são o resultado de uma falha na integração dos componentes pré-genitais da sexualidade numa forma madura. [5]
É a independência da pulsão que caracteriza a perversão. Se um impulso agressivo se manifesta de forma socialmente ajustada, ajudando o indivíduo a superar obstáculos ou a defender-se de um ataque, não existe aí nenhuma conotação perversa. No entanto já se pode falar em sadismo quando a hostilidade e agressão têm por objetivo a imposição do sofrimento e da dor como um fim em si. Na criança existe um acúmulo de impulsos agressivos e hostis. Sua fraqueza e sua dependência dos adultos acaba impedindo a liberação destes impulsos hostis.  Mas o predomínio e a fixação dos componentes agressivos do complexo de Édipo, algumas vezes se aliam à rivalidade e competição com os irmãos, originando o sadismo. E então sentimentos e impulsos agressivos podem se libertar, expressando-se através de crueldade para com objetos mais fracos. A criança pode ser muito cruel com os irmãos mais novos, ou com pequenos animais. A princípio, as agressões a um dos pais, ou aos irmãos, tem por objetivo conseguir a exclusividade do amor por parte do objeto de desejo. Mas aos poucos a agressão ganha independência e se estabelece como um fim em si mesmo. O sadismo pode se manifestar através de comportamentos de ataque, destruição, atitude de dominação e conquista,
Quanto ao masoquismo, ele se afirma quando a necessidade de punição e sofrimento se torna erotizada. Existem atos de renúncia, e de auto-limitação, subordinados ao princípio da realidade. Ou seja, uma pessoa pode se submeter voluntariamente a uma privação, e mesmo à dor, se isto for necessário para alcançar um objetivo desejado. No entanto, o masoquismo passa a existir quando a dor e o sofrimento se tornam um fim em si mesmo. Então a pessoa tem prazer em punir-se, e busca o sofrimento pelo prazer do próprio sofrimento, e não como um meio necessário para atingir um determinado objetivo. O comportamento passivo da submissão também é uma forma de masoquismo. Dentro da perspectiva freudiana, a ansiedade e a culpa provocadas pela concorrência da situação edipiana, e pela rivalidade com os irmãos podem levar ao masoquismo. A princípio, a auto-punição alivia a culpa pela hostilidade sentida para com o pai ou para com a mãe. Porém gradualmente a punição vai se tornando erotizada.
As perversões são produzidas como desvios de uma adequada elaboração do complexo de Édipo, desvio que privilegia uma determinada pulsão pré-genital. O que Freud está dizendo, então, é que a sexualidade infantil é constituída por componentes perverso-polimórficos, e que em seu desenvolvimento, a sexualidade pode sofrer perturbações. Como na inversão homossexual da escolha de objeto, foco da análise que Freud vem realizando em Os Três Ensaios sobre uma Teoria Sexual.  A partir do homossexualismo, o qual ele ainda designa - de acordo com as concepções predominantes da época -, como uma das aberrações da sexualidade, Freud vai demonstrar que não existe uma dependência entre o sexo do indivíduo e sua eleição de objeto. Originalmente a libido não tem preferências: ela investe indiferentemente em objetos sexuais femininos ou masculinos.[6] Finalmente, numa nota acrescentada em l9l0, Freud acaba resgatando a conotação negativa emprestada ao homossexualismo, ao afirmar a questão da bissexualidade:
...todo indivíduo é capaz de uma eleição homossexual  de objeto e a levou, efetivamente, a cabo em seu inconsciente. Pode-se inclusive afirmar que a ligação libidinosa a pessoas do mesmo sexo desempenha na vida psíquica normal um papel tão importante como a que recai sobre pessoas de sexo contrário, apresentando ainda uma maior significação no que se refere à gênese  de estados patológicos. [7]
Aprofundando sua análise, Freud tem a audácia de afirmar que o interesse sexual exclusivo do homem pela mulher constitui um problema, e não algo natural. Com isto ele tenta derrubar, definitivamente, o preconceito contra o homossexualismo.
Freud lembra que a eleição de uma atitude sexual definitiva só vai ocorrer depois da puberdade, e será resultado de uma série de fatores, constitucionais ou acidentais. Ou seja, uma multiplicidade de fatores determinantes acaba produzindo uma diversidade de comportamentos sexuais, herança de nossa criança “perversa-polimorfa”. A importante questão que Freud está reformulando, aqui, prende-se à categoria do instinto com seu determinismo de objeto:
Resulta que nós representamos como excessivamente íntima a conexão do instinto sexual com o objeto sexual. (...) entre o instinto sexual e o objeto sexual existe uma solda, cuja percepção pode nos escapar na vida sexual normal, na qual o instinto parece trazer consigo seu objeto. Surge, assim, a necessidade de dissociar, até certo ponto em nossas reflexões, o instinto e o objeto. Provavelmente, a pulsão sexual é, em princípio, independente de seu objeto, e não deve sua origem às excitações emanadas dos atrativos do mesmo. [8]
Com esta reformulação Freud abre as portas da normalidade para as perversões. A pulsão é livre, é independente do objeto, tem uma característica perversa polimorfa. Os desejos podem, agora, tomar qualquer direção. Não mais se apresentam com a obrigatoriedade de seguir um caminho pré-determinado pela natureza, ou pela constituição genética. A solda entre a pulsão e seu objeto, será realizada pelo social. O desejo passa a ser lido como uma produção historicamente determinado.
Interessante é verificar a ambigüidade para onde Freud é carregado, quando procura sustentar o fundamento platônico de um objeto ideal para a sua pulsão.[9] Os outros objetos passam a ser cópias imperfeitas de um modelo, talvez inatingível.[10] As perversões serão cópias degradadas em relação à perfeição do objeto idealizado. Mas, apesar disto, Freud acaba sustentando a imperfeição, o desvio e o erro, pois termina por retirar as perversões da ordem da patologia. Afirmando seu lado sofista,[11] Freud assume que as perversões fazem parte da vida sexual quotidiana. E a patologia só será caracterizada, não pela existência das aberrações, porém por sua intensidade e exclusivismo.
Os doentes mentais mostram unicamente tais aberrações em um grau mais elevado ou - coisa especialmente significativa - levadas à exclusividade, e substituindo a satisfação sexual normal. [12] 
No desenvolvimento da sexualidade, basta que o indivíduo “se apegue excessivamente ao prazer preliminar para deslizar para a perversão”.[13] As pulsões são produzidas em várias partes do corpo. E ela não tem um objeto próprio, ou um objeto natural.
Como afirma Garcia-Roza (1990):
Seu objeto será oferecido pela fantasia, o que implica a submissão da pulsão à articulação significante, e é aí que vai ser possível a caracterização do sexual. Anteriormente a essa submissão, o sexual carece de significado. E é em termos de significantes que o sexual vai se constituir como diferença. [14]
A partir de 1905, um grande número de autores vai se interessar pelo estudo das perversões. Como nosso interesse não é o de fazer um levantamento das diversas teorias, e sim montar um suporte teórico para a interpretação de Álbum de Família, peça de Nelson Rodrigues, estamos delineando apenas os pontos de vista mais clássicos. Para isto nada melhor do que tomar a síntese feita por Fenichel, a qual permanece ainda hoje uma das melhores referências a respeito da psicopatologia psicanalítica. Chazaud, por exemplo, baseia-se em Fenichel, para se organizar em torno das perversões. Introduz contribuições mais atuais sobre a constituição e o processo das perversões.[15] Entretanto todas estas visões continuam mantendo as características essenciais de exclusividade e parcialidade da pulsão perversa. Sendo nossa intenção apenas clarificar a terminologia que vamos empregar na interpretação da peça de Nelson, vamos evitar a exposição dos contrastes e nuances que vão colorindo as diversas formulações. Como foi exposto, estamos nos atendo apenas às formulações compreendidas como mais “clássicas”. Afinal, como o próprio Chazaud nos lembra, após analisar as diversas perspectivas teóricas:
O terreno das perversões segue sendo, pois, problemático. Parece sensato admitir, como ponto de partida, os pressupostos clássicos. E, além disto, não está fora de tom o fazer a relação de algumas formas perversas mais conhecidas, sem querer esgotar todas as sutilezas clínicas e pretender resolver todos os problemas.[16]
De qualquer forma o livro de Fenichel é uma leitura obrigatória, por sistematizar a doutrina psicanalítica sobre a matéria. Logo no início de seu capítulo sobre as perversões, ele nos reporta algo curioso. Os perversos sentem uma compulsão a exercer seu sintoma. Demarca claramente a existência de uma estrutura especificamente perversa. Este era o caminho aberto por Freud, quando ele afirma, nos Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade, que “a neurose é o negativo da perversão”. Outros autores vão percorrer esta trilha, procurando um melhor registro da estrutura perversa. Mas Fenichel já tinha tornado este deslocamento mais fácil, pela clareza de suas colocações. Fazendo a distinção em relação à estrutura neurótica, ele vai afirmar que o neurótico sente o sintoma[17] como penoso. Ora, o sintoma é efeito do reinado perverso polimorfo da infância. Quando mal elaboradas, as pulsões parciais da sexualidade pré-genital, procurando uma via de acesso para a satisfação, acabam constituindo o sintoma. Por isto se diz que os sintomas neuróticos são atos perversos disfarçados; ou, como disse Freud, a neurose tenta reprimir aquilo que a perversão atualiza.
A perversão assume objetivos idênticos aos da sexualidade infantil.[18] E uma distinção que marca o estilo do perverso está no caráter prazenteiro[19] do impulso. Como nos recorda Chazaud:
As atividades perversas se cumprem com a finalidade explícita de alcançar o gozo. No instante do ato, o perverso está de acordo com sua impulsão. Este é o escândalo. [20]
Fenichel desenvolve este fenômeno de uma forma mais detalhada:
O que parece ser característico é o modo de sentir o impulso irresistível. O neurótico sente-se forçado a fazer algo que não lhe agrada, enquanto que o perverso se sente forçado a algo que lhe agrada, ainda que contrário à sua vontade. Mesmo que ele possa vivenciar o sentimento de culpa, no momento da realização do ato, este será sentido como algo que o sujeito quer fazer com o objetivo de alcançar um prazer. [21]
Para Freud, a perversão iria se constituir por uma fixação (detenção no desenvolvimento) ou por uma regressão. Mas, nem todas as regressões à sexualidade infantil vão constituir perversões típicas. Quanto à fixação, é ela que vai determinar qual dos componentes infantis será privilegiado.
Mas, como caracterizar a perversão típica? Segundo a definição de Fenichel, o perverso típico só tem uma maneira de achar prazer sexual:
Todas suas energias sexuais se acham concentradas em um instinto parcial particular, e este instinto hipertrofiado compete com sua primazia genital. [22]
A perversão é, então, a intensificação ou predomínio de uma determinada pulsão parcial que se torna extremamente privilegiada. Mas isto não exclui o perverso do gozo genital. O predomínio da genitalidade não deixa de existir. Está apenas perturbado.  A sexualidade perversa não é desorganizada como a sexualidade perversa polimorfa das crianças ou das personalidades infantis.
Existe aqui uma diferença que marca o limite entre a pulsão perversa-polimorfa e o caráter patológico da perversão. A patologia não está no modo nem no objetivo sexual, porque de outra forma a perversão infantil seria patológica. A perversão só se constitui como patologia enquanto prática exclusiva e limitada, fixada nas pulsões que se tornaram preliminares à lei da genitalidade. 
O que seria então determinante na constituição da perversão? Dentro da teoria psicanalítica que tem o Complexo de Édipo como nuclear, a resposta não poderia ser outra. Só que o perverso vai viver o Édipo e a concomitante angústia da castração de um modo muito especial. 
E se, numa primeira aproximação, as perversões clínicas aparecem como simples “fixações” sexuais infantis, sua estrutura efetiva inclui também a angústia, a culpa, a regressão, dentro de um jogo diferenciado até o fenômeno edípico que dá aos fatos todo seu relevo. [23]
Mas não se trata de uma simples substituição da sexualidade adulta, genital pelo erotismo parcializado da primeira infância. O fato de uma das pulsões parciais se achar intensificada não significa que o perverso não sofra suas repressões. Uma parte da sua sexualidade infantil é recalcada, o que termina por perturbar a capacidade genital. A genitalidade espontânea fica bloqueada. E é para superar tal bloqueio que surge o sintoma perverso.[24]  Ou seja, somente a gratificação de uma determinada pulsão parcial vai conseguir anular a perturbação da primazia genital. O que a psicanálise propõe, então, é que a perversão é adotada como uma forma de defesa. O perverso, assim, faz uma repressão parcial. Em Fetichismo, Freud vai se aproveitar do termo escotomização para se referir a este fenômeno. A escotomização indica o fato de uma parte da vida psíquica não reconhecer uma realidade desagradável, enquanto a outra parte se dá conta perfeitamente daquele fato.[25]
Em outras palavras, a perversão vai procurar facilitar o recalque de uma parte insuportável da sexualidade infantil, a qual é inadmissível para o sujeito, devido à quantidade de angústia que ela provoca. É este o elemento comum que percorre todas as perversões. Ou seja, existiria em todas elas (sadismo, masoquismo, pedofilia, fetichismo, etc.) um único fator que perturbaria a primazia genital. E é o mesmo fator que vai produzir idêntico efeito de medo e culpa nos neuróticos. É o medo da retaliação quando a criança se envolve nos complexos sentimentos do Édipo. “O gozo sexual se fez impossível por causa do temor da castração”.[26] O que é decisivo na perversão é o tremendo impacto causado pelo complexo de castração. Como lembra Chazaud:
Tudo acontece como se o perverso recusasse a angústia da castração e negasse seu temor, hipertrofiando um instinto parcial que assegura a repressão do complexo de Édipo à maneira de uma recordação encobridora. [27]
É sempre a angústia de castração o obstáculo que vai impedir o exercício de uma sexualidade genital completa e satisfatória. E se o prazer genital se tornou impossível, em vista dos perigos da castração, nada mais resta a não ser regredir àquela parte da sexualidade infantil em que a pessoa está fixada. Algumas experiências da infância agem como traumas fixadores, e vão atrair o perverso.[28]
Esta fórmula é aplicada a todas as perversões, sem exceção. Fenichel vai examinar cada uma delas através do mesmo crivo.[29] A mesma coisa vai fazer Chazaud. Embora sua escolha recaia em um número menor de perversões, ele estuda alguns destes fenômenos em capítulos separados. É dele a seguinte observação à propósito da constituição da estrutura perversa: 
Um estudo estrutural profundo nos mostraria que os processos perversos têm relações antitéticas e simétricas com a sublimação e com a idealização, que é preciso tomar aqui em consideração.  [30]
Chazaud lembra que a idealização está na origem da repressão assim como estaria na origem das formações reativas e das sublimações.  A este propósito queremos apenas tecer uma consideração. Pensamos ser possível dizer, de fato, que a idealização norteia a repressão.[31] Mas devemos tomar cuidado com este sentido da idealização, uma vez que este mecanismo de defesa está muito vinculado a processos de dissociação da realidade.[32] Mas Chazaud é tentado a pensar que as perversões representam um paradoxo da idealização:
Idealização da pulsão parcial, intensamente satisfeita e “superestimada” em uma relação parcial  também com o objeto ou com um  objeto parcial. [33]
Para finalizar, uma última observação que se aplica às perversões de um modo geral. A perversão despersonifica o objeto do desejo perverso. Em certo sentido, a cooperação do parceiro é dispensada, e ele é rebaixado da ordem de objeto de amor para a dimensão de objeto de uso.
No entanto, existe na dupla perversa uma cumplicidade tácita, que aponta para uma espécie de acordo entre o sádico e o masoquista, ou entre o voyeur e o exibicionista, entre o fetichista e seu fetiche. Estes vínculos, assim como outras questões teóricas que se apresentarem, vão ser melhor examinados no decorrer da análise de Album de Família, quando então as características de personalidade dos diversos personagens contribuirão para tornar mais clara a exposição das diferenças entre algumas formas de perversões. 


[1] J. Laplanche,   J. B.  Pontalis,  Vocabulário de Psicanálise, p.  432.
[2] S. Freud, Os Três Ensaios para uma Teoria da Sexualidade, p. 1.18l.
[3] Op. cit., p. 1218.
[4] Op. cit., p. 1.181.
[5] Franz Alexander - Fundamentos da Psicanálise, p.  238.
[6] Estes fatos são comprovados não só na infância, como também em culturas primitivas.
[7] Freud, S, em Os Três Ensaios para uma Teoria da Sexualidade, p.  1.178.
[8] Op. cit., p.  1.179.
[9]Talvez por isto Freud não ouse ainda combater a designação do homossexualismo como uma “aberração da sexualidade”.
[10] A sublimação vai se encarregar de desviar a pulsão de seu objeto original, que fica perdido para sempre. Exceto para o psicótico ou para o pervertido.
[11] A filosofia platônica lida com a verdade das Idéias. Já a filosofia estóica valorizava os incorporais, ou seja os acontecimentos, formadores do sentido. Os sofistas instrumentalizam esta filosofia e vão ser terrivelmente combatidos por Platão. O diálogo com Górgias tem este fim, arrasar com o sofista. Porque eles assumem a lógica estóica, criando ilusões que enganam o povo. Os estóicos eram nominalistas. Os universais, as essências, as Idéias não existiam para eles. As idéias gerais eram abstrações, que não tinham condição de expressar o ser da coisa, mas somente o pensamento sobre a coisa. O real só podia ser individual. A lógica platônica, então, não podia fazer nenhum sentido para o estóico. Ela convidava a duas distinções: a) por um lado, as coisas limitadas e medidas, as qualidades fixas (permanentes ou transitória), que era a dimensão das Idéias e,  b) por outro lado, a dimensão do puro devir sem medidas, um devir-louco que não se detém jamais, que acontece nos dois sentidos ao mesmo tempo contrariando o “bom senso”; é nesta dimensão que se passa aquilo que se subtrai à ação da Idéia. O puro devir é a matéria dos simulacros. O simulacro contesta “ao mesmo tempo tanto o modelo como a cópia”. É isto que Deleuze vai nos ensinar na Lógica do Sentido.  A  lógica estóica trabalha sobre os paradoxos dos efeitos de superfície. E Platão combate tudo isto como erros e ilusões, contraposições da Verdade das Idéias. Quando Freud se posiciona a favor dos homossexuais e das perversões, absorvendo estes fenômenos como efeitos de superfície, como comportamentos que vão estar sujeitos ao devir dos acontecimentos, ele está combatendo a Verdade estabelecida da Natureza. Por isto ele é um sofista.
[12] Op. cit., p. 1219.
[13] Op. cit., p. 1219.
[14] Luis Alfredo Garcia-Roza, O Mal Radical em Freud, p. 144.
[15] Chazaud faz uma revisão crítica, bastante interessante, sobre algumas das perspectivas contemporâneas sobre a perversão. Cita os trabalhos da escola lacaniana, referindo-se à sua melhor representante, neste terreno, P. Aulagnier. Refere-se ao desdobramento da visão kleiniana, realizado por Diatkine. E cita ainda Glover e Joyce MacDougall. Além destas perspectivas psicanalíticas, Chazaud discute também o ponto de vista antropológico. J. Chazaud, Las perversiones sexuales.
[16] Op. cit., p.  53
[17] As pulsões parciais de uma sexualidade pré-genital continuam se esforçando na direção da satisfação e acabam constituindo uma via de acesso à satisfação, através do sintoma neurótico.
[18] Fenichel resumindo a questão, constata que perversos são pessoas nas quais a sexualidade é infantil, em vez de ser adulta”. Otto Fenichel , Teoria Psicoanalitica de las Neurosis, p. 416.
[19] Embora existam ações perversas que podem  ser perturbadas pelos sentimentos de culpa, sentindo-se como penosas, ao passo que alguns jogos compulsivos podem adquirir caráter prazenteiro.
[20] J. Chazaud, Las perversiones sexuales, p. 37.
[21] Otto Fenichel, Teoría psicoanalítica de las neurosis, p. 414
[22] Op. cit., p. 417.
[23] J. Chazaud, Las perversiones sexuales, p. 38.
[24] A hipertrofia da pulsão parcial tem dois propósitos: a) servir como reasseguramento contra a angústia de castração e b) servir como força de repressão contra o Complexo de Édipo e outros componentes intoleráveis  da sexualidade infantil.  Assim, o perverso faz uma “repressão parcial” da sexualidade infantil, ao mesmo tempo em que exagera outras partes dela. “A hipertrofia de um determinado componente sexual infantil é utilizada, aparentemente, para fortalecer tal repressão”, Fenichel, Otto, Teoría psicoanalítica de las neurosis, p. 418.
[25]Se em tal conceito queremos diferenciar mais agudamente o destino que sofre a idéia, da vicissitude que acontece com o afeto,  bem podemos reservar para este último o termo repressão, e em tal caso a palavra que mais enquadra o destino da idéia ou da representação seria denegação ou repúdio”.  S. Freud,  Fetichismo, p. 2994. 
[26] Fenichel, Otto, Teoría psicoanalítica de las neurosis, p. 418.
[27] Chazaud, J. , Las perversiones sexuales, p.  39.
[28] De modo geral, foram experiências eróticas que proporcionaram um reasseguramento contra a temor e angústia da retaliação, onde a gratificação sexual foi sentida com especial intensidade porque se aliou à uma negação da castração.
[29] Fenichel estuda, em separado, todo um conjunto de perversões: homossexual idade masculina, pedofilia, fixações de diversos gêneros (anal, oral, voyeuristico); homossexual idade feminina; fetichismos colecionadores; travestismo, exibicionismo, voyeurismo; coprofilia; perversões orais; submissão sexual masoquística; sadismo; masoquismo; e finalmente, combinações de perversões com neuroses. Fenichel, Otto, Teoría psicoanalítica de las neurosis, Pag. 415-494.
[30] Chazaud, J. , Las perversiones sexuales, p. 40.
[31] A idealização amplifica determinadas idéias, e constrói modelos. Os ideais vão sobreviver como normas éticas e estéticas, enquanto sua contrapartida deverá ser reprimida.
[32] S. Mellor-Picault, Idéalisation et sublimation.
[33] Tratar-se-ia de uma idealização parcial, que distinguiria a perversão das verdadeiras sublimações (assim como das formações reativas), que acontecem diante do objeto total.  Imaginamos que Chazaud tenha sido obrigado a adotar esta saída em funcão da ausência de distinção entre idealização e ideal. Esta distinção está bem realizada pelo artigo de Mellor-Picaut citado anteriormente. J. Chazaud, Las perversiones sexuales, p. 42.